Perícia contábil bancária. O nome já traz certo “peso” para quem está começando. Afinal, bancos, extratos, transferências… números que vão e voltam, sem avisar. Um mundo à parte, no qual um pequeno detalhe pode fazer toda a diferença para uma conclusão técnica segura.

Imagine o seguinte: você recebe um envelope pardo — repleto de extratos bancários, dezenas de páginas, símbolos, lançamentos agrupados sem muita ordem. A tarefa? Encontrar o fio condutor dessa movimentação. O verdadeiro fluxo de valores. Parece missão para detetive? Em parte, talvez seja.

O que é movimentação bancária em uma perícia

A movimentação bancária, quando inserida em um processo pericial, representa o trajeto real do dinheiro. O que entra, o que sai, de onde veio, para onde foi. Não é só quantidade: é contexto.

Esse levantamento busca mostrar, com base em registros oficiais, a verdadeira relação financeira do periciado. E, acredite, cada extrato traz muito mais do que números.

O detalhe revela a verdade escondida.

Principais passos para análise de movimentação bancária

Engana-se quem pensa que é só “bater olho no saldo”. Existe uma sequência de tarefas que, se não for respeitada, pode comprometer a análise — assim como uma narrativa confusa arruina um bom livro.

1. Entender o objetivo da perícia

Antes de começar, é provável que você se pergunte: “O que querem provar?” Pode ser desde uma suposta fraude até verificação de capacidade de pagamento, passando por rastreamento de desvios ou ocultação de bens. Esse norte muda tudo.

• Revisão do laudo inicial ou quesitos.
• Análise do pedido judicial.
• Levantamento de quais movimentos bancários importam para o caso.

Talvez pareça repetitivo, mas é fundam… não. É só questão de foco. Sem saber para onde ir, qualquer dado pode parecer suspeito — e, muitas vezes, não é.

2. Coletar e organizar os documentos

Receber documentos espalhados, um pouco aqui e outro lá, é comum.

• Extratos bancários completos, com todas as páginas.
• Comprovantes de transferências, depósitos, saques e DOC/TED.
• Correspondências e documentos complementares: contratos, recibos, folhas de cheque, por exemplo.

Se faltar alguma informação, nunca se deve tirar conclusões precipitadas. Solicitar complementação é parte do processo.

3. Conferir a integridade dos extratos

Pare e olhe. Estão todos os meses necessários ali? Há saltos inexplicáveis de datas? Valores “inexplicáveis” aparecem e somem sem correspondência lógica?

Qualquer sombra de dúvida, solicite mais dados ou esclarecimentos. Afinal…

Lacunas abrem espaço para interpretações erradas.

Organizando lançamentos bancários

Agora, imagine que tudo está sobre a mesa. Pilha de extratos em ordem. É hora de organizar os lançamentos — e não é só copiar números num Excel (por mais tentadora que seja essa ideia, às vezes não basta).

Estruture em planilhas

Planilhas funcionam como lentes. Elas destacam movimentações suspeitas, repetições, padrões. Seguindo alguns critérios, fica mais fácil tornar a análise factível e auditável:

• Data
• Descrição do lançamento
• Valor (crédito ou débito)
• Saldo após operação
• Origem/Destino (se identificado)

Dali para frente, buscar padrões se torna mais claro. Já percebi como movimentos recorrentes apontam para salários, retiradas mensais, transferências automáticas. Outras vezes, movimentações isoladas saltam aos olhos, especialmente se ligadas a datas sensíveis do processo.

Reconciliar movimentos

Nunca confie apenas no “saldo final igual ao saldo inicial do mês seguinte”. Por trás da estabilidade, podem existir transferências circulares: dinheiro vai e volta entre contas do mesmo titular ou de ligados — só para inflar números, ou mascarar operações.

Também há que ficar atento a movimentações não justificadas. Pequenos lançamentos, aparentemente corriqueiros, chamam a atenção se somados. Vem aí a pergunta:

Um valor pequeno, repetido demais, esconde o quê?

Pontos mais sensíveis na análise

Movimentação bancária não se limita a olhar o que entrou e saiu. Às vezes, o diabo mora nos detalhes. Há situações que pedem aplicação de técnicas mais avançadas — e uma dose de ceticismo.

Transferências entre contas do próprio titular

Comum, mas… até que ponto? Transferir sempre entre as mesmas contas, com valores idênticos mês após mês, pode indicar tentativas de obscurecer a origem de determinados recursos.

Vale criar uma lista à parte dos lançamentos dessa natureza. Isso facilita explicar para quem, depois, vai ler o laudo — seja juiz, advogado ou parte.

Depósitos em espécie

São sempre um alerta. Entradas em espécie, de maneira recorrente e sem identificação clara, normalmente demandam explicação complementar.

• São compatíveis com a renda declarada?
• Há contrapartidas em saques?
• O padrão se repete em datas estratégicas (como época de autos judiciais)?

Quando não há justificativa plausível, surge aquela dúvida — evitar conclusões apressadas é fundamental, mas explicar esses movimentos é obrigação técnica.

Movimentações via terceiros

Nomes diferentes entre origem e destino precisam ser checados. Pagamentos e recebimentos feitos por terceiros podem indicar procuradores, parentes ou mesmo tentativas de burlar bloqueios judiciais.

Em alguns casos, é preciso solicitar o contrato que justifica o repasse, por exemplo. Outras vezes, não há justificativa. Então, destacar esse ponto no relatório ajuda não só na clareza, mas também coloca o leitor no tempo certo da operação.

Como apresentar resultados

A análise termina quando o laudo consegue contar a história de cada centavo relevante do processo. Não é drama — é precisão. E isso passa, quase sempre, pelo uso de recursos visuais e por relatórios claros e didáticos.

• Use planilhas anexas, indicando as fórmulas e critérios usados
• Destaque irregularidades
• Indique limitações do escopo, materiais faltantes, dados dúbios
• Apresente de forma cronológica e didática

Já vi situações onde, faltando apenas um comprovante, o entendimento de meses inteiros era posto em xeque. Por isso, todo cuidado é pouco.

Ferramentas e referências que ajudam

Hoje, há sistemas e métodos digitais que encurtam o trabalho manual, especialmente onde automação facilita a estruturação. Algumas práticas apresentadas em materiais sobre automação em perícias contábeis e sobre digitalização tornam mais fácil cruzar grandes volumes de dados.

Mesmo assim, o olhar crítico do perito continua sendo insubstituível. É ele quem percebe discrepâncias sutis, questiona o improvável e rejeita coincidências fáceis.

O valor da especialização também aparece nesses momentos: dominar técnicas e experiências acumuladas ajuda a não se perder. Já o controle das finanças pessoais do próprio perito, muitas vezes, também se mostra importante (mesmo que essa parte poucos admitam!).

Para quem se sente sempre “na corda bamba” entre tantas novidades, textos sobre melhoria na coordenação de perícias podem dar segurança extra, até porque métodos mudam mais rápido do que a gente imagina.

Considerações finais

Analisar movimentação bancária em perícias contábeis exige paciência, estudo e abertura para revisões. É um processo que mistura técnica, curiosidade e cautela (às vezes, até um pouco de desconfiança saudável). E ainda assim — toda conclusão é sempre transitória, pois amanhã pode chegar um novo extrato, uma explicação inesperada, um documento que muda tudo.

O número revela, mas a história explica.